O Canto

A música quebra barreiras. Dizem até que ela tem poder de cura. Mas sempre existem alguns tipos de conceitos errados que são pré-estabelecidos no que cerne à produção musical e seus agentes. Existe hoje uma infinidade de modos de se fazer música, tanto no que diz respeito ao modo de se fazer: seja só, seja com um grupo de amigos do bairro em uma garagem, seja de modo colaborativo através de recursos tecnológicos, como montar uma banda pela internet, onde cada integrante está a vários quilometros de distância do outro, seja também na forma de se fazer: música instrumental, música com diversos instrumentos, música com poucos instrumentos, etc. Venho propor uma discussão acerca de um agente importante na produção musical: o vocalista ou cantor se preferir.

Na verdade eu prefiro vocalista pois tenho como foco o contexto de banda, onde todos são importantes e estão, em tese, no mesmo nível hierárquico. O que quero dizer com isso? Quero me ater naquela banda, seja aquela de garagem que está começando agora e seus membros púberes mal tocam seus instrumentos, seja aquela que já rodou o mundo e colhe os frutos do sucesso. O vocalista é visto muitas vezes como o cara que quer atenção, o mais desembaraçado. Até pode parecer verdade se pensarmos que é preciso ter muita coragem para, dependendo única e exclusivamente daquilo que nasceu com você, se expor em frente a vários desconhecidos, mas existem alguns aspectos que tanto mostram que isso não é necessidade de aparecer e que conseguir cantar aquela música e contagiar a platéia que está a sua frente é, além de fruto de muito trabalho, algo extremamente admirável.
 
Eu tentei por um curto período de tempo ser também um vocalista, na verdade tentei como tantos unir essa qualidade com a minha perícia subdesenvolvida na arte de tocar guitarra. Eu aprendi muita coisa, que o jeito que falamos normalmente além de ser errado é demasiadamente nocivo às nossas pregas vocais, isso mesmo, eu não disse cordas, são chamadas de pregas mesmo. Isso acontece porque quando falamos deveríamos ter uma postura diferente, com apoio do nosso diafragma para projetarmos nossa voz e nas pregas vocais apenas fazermos a modulação da voz. Como assim? Bem, o diafragma deveria servir de base para nossos pulmões quando falamos, empurrando assim o ar dos pulmões esvaziando-os. Mas o que isso importa? É algo como aprender a digitar escalas na guitarra, correto? Não é bem assim. Aí entra a outra análise que eu disse no início: empostar sua voz, utilizando o diafragma como apoio e conseguir projetar sua voz é uma das coisas mais difíceis que existe. Basicamente é assim porque envolve algo que você faz errado desde tempos remotos, respirar. Não é algo novo que você pratica e depois de algum tempo domina. É como o fumante que tenta parar, você já tem um hábito arraigado em seu subconsciente e, a não ser que se esforce e se concentre decididamente, não conseguirá nunca mudar esse hábito. Agora imagine ter de se concentrar, ter foco suficiente para ignorar o que está a sua volta, mudar o funcionamento "normal" que seu corpo está acostumado desde a infância e ainda ter de lembrar a letra. Complicado, não é? Um vocalista tem de estar totalmente confiante em sua capacidade para que possa desempenhar bem sua função. Senão fica igual uma pessoa tímida, sussurrando com medo. Isso acontece porque sem confiança a concentração vai por água abaixo. Depois de dominar a forma de respirar corretamente e usar o ar dos pulmões para projetar sua voz em vez de sua garganta, vem a parte interessante.


Podemos dizer que a música tem algumas divisões ao pensarmos nas funções de cada instrumento: a bateria é o coração, ditando o ritmo, a "pulsação" de determinada canção. O baixo dita o contorno, a moldura da música quando em conjunto com a bateria. É o esqueleto da música. A guitarra é a alma da música, o tempero. Finalizando, a voz é a parte racional, o cérebro da música, pois é o agente que expressa as idéias do compositor. Nada mais decepcionante do que ouvir aquele som que lhe toca de forma especial e, ao prestar atenção na letra, ver que se trata de algo banal ou mesmo idiota. Sem contar no tipo de vocal necessário para cada música. Não tem como fazer uma balada sobre amor, por exemplo, utilizando vocais guturais. Da mesma forma ficaria estranho usar uma cantora lírica para esbravejar furiosamente e contestar o atual modelo social. Apesar de existirem inúmeras músicas instrumentais de imensa qualidade e que até conseguem nos fazer sentir algo próximo do que o compositor tinha intenção, através das palavras conseguimos chegar a esse resultado de modo mais ágil e de forma a reduzir as falhas nesse aspecto, como a questão interpretativa individual. Eu posso ouvir uma música lenta e pensar em amor como outro pode ouvir a mesma música e pensar em morte. É o tipo de coisa que nem sempre é interessante para o artista pois diverge de sua mensagem inicial.

Como dito antes, pode-se atribuir à música várias características e várias reações que ela provoca no ouvinte. Pode emocionar, indignar ou simplesmente proporcionar alguns momentos de diversão. Todos os instrumentos são importantes na junção musical e cabe ao vocalista a difícil missão de dar à banda uma cara, de ser uma espécie de interface para a interação entre banda e público. Ele deve passar a mensagem da música da forma que foi pensada quando composta e fazer o público receber essa mensagem. Por isso usa-se para estes integrantes o termo também de frontman ou frontwoman, tal qual uma unidade de infantaria num exército, cabe ao cantor a missão de derrubar a barreira inicial gerada pela expectativa e conseguir contagiar a audiência. Isso só é possível após muito trabalho duro e com a devida preparação emocional para aquele momento. Pois não há nada pior do que chegar na hora H e não conseguir atingir as notas adequadas por não conseguir se concentrar na respiração ou por esquecer a letra.

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